27.9.07

Cena Final

Ao entrar em casa, olha ao redor de maneira religiosa. A sala, aquele velho sofá, as manchas no tapete, e todas as outras coisas com as quais viveu tanto tempo e, ao mesmo tempo, prestou tão pouca atenção. Lembra da vez que seu filho, ainda bebê, descobriu uma falha na pintura da parede e começou a descascá-la. Tudo isso ainda estava lá - sempre prometeu repintar aquela parede mas, no fundo, sabia que não ia fazê-lô. Só não sabia se era por preguiça, ou pela lembrança que lhe vinha a mente. Talvez fosse os dois. Talvez não importasse. É, não importa.
Passa pelo corredor repleto de fotos. De um tempo onde algo ainda fazia sentido. Algo ainda brilhava. Entra no quarto. Despe-se. Pela primeira vez na vida coloca a roupa suja no lugar de roupa suja. Ao perceber o fato, olha para cima e ri de maneira irônica.
Visita a cozinha como se nunca estivesse ali. Tudo parece novo, estranho, repulsivo até. Comer é a última coisa que passa pela sua cabeça.
Volta à sala. Senta em seu sofá, nu. Acende dois cigarros. Calmamente leva um a boca, enquanto deixa o outro a postos num cinzeiro. Os pensamentos vem e vão - futís, infrutíferos, prazeirosos e perniciosos - como a fumaça que entra e sai de seu peito. O pensamento É a fumaça que passa por seu corpo.
Ele agora a espera. Aquela que nunca falta, nunca erra. A única que mantém sua promessa desde o momento em que nascemos. Talvez até antes disso. Em forma de respeito - e não de súplica - um cigarro a aguarda. O presente perfeito. E ela há de chegar antes dele queimar.

1 Comments:

Blogger Mr.Ed said...

Uuuow !!!

15/5/08  

Postar um comentário

<< Home